- Cível e Consumidor
Tendo os trabalhos iniciados no dia 04 de setembro de 2023, a comissão de juristas destinada à revisão e atualização do Código Civil, presidida pelo ministro Luís Felipe Salomão, integrante do Superior Tribunal de Justiça, se debruça diante do desafio de analisar a legislação face à inquestionável mudança do cenário social brasileiro desde o ano de 2002, especialmente aquelas promovidas em razão do advento de novas tecnologias e seus impactos sobre o Direito Civil.
Em 23 de outubro de 2023, mencionada comissão se reuniu na sede da Ordem dos Advogados do Brasil em São Paulo para promover o debate, em audiência pública, sobre as sugestões recebidas de profissionais da Região Sudeste.
Destaca-se que a própria comissão realizou uma divisão interna para otimização dos trabalhos, por meio de um grupo específico para o Direito Digital, de relatoria parcial de Laura Porto, integralizada por Ricardo Campos e Laura Schertel Mendes. No caso, a própria relatora afirmou, no mencionado evento, que o tema Herança Digital já está sendo desenvolvido pela comissão. Sob a ótica da doutrina, a sucessão digital se subdivide em Patrimonial, Existencial e Patrimonial-Existencial.
A questão de herança digital patrimonial, ou seja, a divisão dos bens que estejam em meios digitais tem, por seu princípio, os bens digitais de natureza predominantemente econômica, como por exemplo NFT e as milhas aéreas, vez que, sob a ótica patrimonial, explora o que pode se ocorrer após a morte do usuário proprietário destas milhas, sendo possível, pois, a partilha em um processo de inventário ou ainda o repasse aos herdeiros desde que comprovado o óbito do proprietário.
Já a herança digital do âmbito existencial se refere diretamente aos direitos da personalidade, direito este que se extingue com a morte, como firmado no artigo 6º do Código Civil, constituindo o predominante valor sentimental. A questão existencial definiria, por exemplo, se as contas em servidores de armazenamento em nuvem ou até livros digitais poderiam ser transferíveis ou acessadas pelos herdeiros – no conceito legal, e quais são os riscos de violação legal ao realizar o compartilhamento de acesso. Sob este aspecto, destaca-se a importância do impacto perante terceiros e consequentes violações a direito a eles vinculados, tais como acesso a conversas em aplicativos de mensagens instantâneas, acesso a e-mails particulares ou ainda a comunicações de profissionais que devem resguardar o sigilo com outra parte (a exemplo de professores, médicos, psicólogos, psiquiatras, líderes religiosos etc), já que a preservação do sigilo é condição imprescindível para a efetivação da prestação de serviço.
Por fim, o aspecto híbrido é relacionado a questões patrimoniais e existenciais de maneira conjunta, tais como perfis em redes sociais utilizados para fins profissionais, seja por meio de realização de publicidade virtual, produção e divulgação de artes, produção e divulgação de músicas ou ainda a exploração financeira por meio de exposição de opinião (influencers). Afinal, qual é o limite legal – ou até mesmo limite ético – da continuidade de monetização de monetização em perfis de celebridades falecidas, além do consequente repasse aos herdeiros e, notadamente, o termo de utilização da imagem e autoridade do de cujus?
Chama a atenção a visão dos profissionais audiovisuais sobre o tema, notadamente o ator Robin Williams, que restringiu a utilização de sua imagem ou ainda a análise da autorização da utilização das imagens de Carrie Fisher, por sua família, para o Episódio IX da franquia Star Wars, bem como do ator Paul Walker ou ainda as músicas então inéditas do grupo Charlie Brown Júnior.
Para além das questões envolvendo pessoas públicas, o tema também é caro para quem resolve viver de maneira low profile, ou não tão exposta, afinal deve ser discutida a possibilidade de manutenção da privacidade, em suas mais diversas camadas, do titular e do animus em torná-la disponível na exata extensão de sua vontade.
Diante a tantas atualizações do mundo digital, que impactam na inconsistência de direitos direcionados à Herança Digital, tende ser cada vez mais recomendado o olhar cauteloso sobre o tema, inclusive com eventual efetivação de testamento público destacando as vontades e a privacidade dos bens digitais de propriedade e posse do titular, bem como atentar-se às consequências da propagação das notícias e acusações post mortem a fim de que, em última instância, seja garantido o merecido descanso ao titular falecido.
A Equipe Cível do escritório Cordeiro, Lima Advogados Associados permanece à disposição para esclarecer qualquer dúvida que sobre o tema.
Brendha Vitória Lopes Constantino – brendha.constantino@cordeirolima.com.br
Hélio Tomba Neto – helio.tomba@cordeirolima.com.br
Suen Ribeiro Chamat – suen@cordeirolima.com.br