- Direito Público
Tema 1199: Ministro Alexandre de Moraes definirá sobre a (ir)retroatividade das disposições contidas na Nova Lei de Improbidade Administrativa.
Em 26 de outubro de 2021 entrou em vigor a Lei nº 14.230, que alterou a Lei nº 8.429 de 1992, que dispõe sobre as sanções aplicáveis em virtude da prática de atos de improbidade administrativa.
A nova lei trouxe mudanças significativas, a fim de conferir maior objetividade no combate e na responsabilização do cometimento de atos de improbidade, demonstrando, por parte do legislador, uma “preocupação com o combate à improbidade, de forma adequada, atingindo todos, mas tão somente àqueles que estão ligados à prática do ato”.[1]
A maioria destas mudanças impacta diretamente no enquadramento da conduta imputada ao agente como ímproba e na sanção a ser aplicada, nas hipóteses em que este seja condenado.
A título exemplificativo, a nova Lei, nos termos do art. 1º, § 1º, exige a comprovação do elemento subjetivo dolo – vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado (art. 1º, § 2º) – para a responsabilização do agente, não caracterizando mais como ato de improbidade a conduta culposa.
Outra inovação relevante diz respeito à necessidade de que o dano seja efetivamente comprovado, inclusive em sua extensão e, em caso de condenação ao ressarcimento, deve haver o desconto dos serviços efetivamente prestados.
Percebe-se que muitas das inovações trazidas pela Lei nº 14.230/21 são benéficas ao agente tido como ímprobo, o que ensejou amplo debate acerca da aplicação do princípio da retroatividade da lei mais benéfica, conforme previsto no artigo 5º, inciso XL da Constituição Federal[2].
Apesar da retroatividade da lei mais benéfica ter natureza de princípio geral de Direito, previsto na Constituição Federal, a jurisprudência diverge sobre a sua aplicação no âmbito do Direito Administrativo Sancionador.
Diante disso, em 03 de março de 2022, o Ministro Alexandre de Moraes reconheceu a repercussão geral da matéria constitucional no âmbito do Recurso Extraordinário nº 843.989/PR – Tema 1199, por meio do qual decretou a suspensão do processamento dos recursos especiais nos quais suscitada, ainda que por simples petição, a aplicação retroativa da Lei nº 14.230/2021.
O Recurso extraordinário afetado discute, à luz do artigo 37, § 5º, da Constituição Federal, “a prescritibilidade dos atos de improbidade administrativa imputados à recorrente, por alegada conduta negligente na condução dos processos judiciais em que atuava como representante contratada do INSS, sem demonstração do elemento subjetivo dolo (Temas 666, 897 e 899 do STF). Delimita-se a temática de repercussão geral em definir se as novidades inseridas na Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/1992, com as alterações dadas pela Lei 14.230/2021) devem retroagir para beneficiar aqueles que porventura tenham cometido atos de improbidade administrativa na modalidade culposa, inclusive quanto ao prazo de prescrição para as ações de ressarcimento”.
Em breve o Supremo Tribunal Federal deverá enfrentar o tema, mas, longe de realizar exercícios de futurologia, cremos que o entendimento será pela retroatividade da Lei mais benéfica, considerando o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça[3] e do próprio STF acerca do tema, o qual, nas palavras do ministro Gilmar Mendes, relator do ACO 3.485, foi expresso ao afirmar que “a retroatividade da norma administrativo-sancionatória mais benéfica […] incidirá sobre os fatos jurígenos ocorridos em período anterior à sua vigência (…)”.
E este, ao nosso ver, é o posicionamento mais acertado, na medida em que “o engessamento das normas defasadas e injustas não traria nenhuma vantagem social. A retroatividade decorre de um imperativo ético de atualização do Direito Punitivo, em face dos efeitos da isonomia.”[4]
A equipe de Resolução de Controvérsias está à disposição para maiores esclarecimentos.
Bruna Cancio – (11) 3389-9122
[1] GAJARDONI et al, Fernando da Fonseca. Comentários à Nova Lei de Improbidade Administrativa: Lei 8.429/92, com as alterações da Lei 14.230/21. 5ª ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021, p. 157.
[2] XL – a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu;
[3] RMS 37.031, relatora ministra Regina Helena Costa, DJe de 20/2/2018.
[4] OSÓRIO, Fábio Medina. Direito Administrativo Sancionador. 7ª ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2020, p. 300-304.