• Direito Digital
19/fev/2024
Cordeiro
O Dia Internacional de Proteção de Dados e alertas para 2024

No dia 28 de janeiro comemora-se mundialmente o Dia Internacional da Proteção de Dados. Mencionada data celebra o dia da assinatura da chamada Convenção 108 do Conselho da Europa para Proteção das Pessoas Singulares, único tratado internacional sobre proteção de dados, cujo nome oficial é Convenção para a Proteção de Indivíduos com Relação ao Processamento Automático de Dados Pessoais. E para o ano de 2024, as reflexões e debates sobre proteção de dados está mais presente do que nunca na pauta dos especialistas e do público em geral.

A transformação cultural da sociedade para as discussões sobre privacidade e o empoderamento dos titulares ao questionarem o porquê do tratamento de seus dados pessoais impactou frontalmente o Direito e o cotidiano dos cidadãos. O movimento Ocupy Wall Street (2011), o Caso Snowden (2013), o escândalo da Cambridge Analytica (2014) e, mais próximo à realidade brasileira, o acesso indevido a fotos da atriz Carolina Dieckmann (2011), o vazamento do prontuário da ex-primeira-dama Marisa Letícia (2017), a exposição da intimidade da atriz Klara Castanho (2022) e os recentes debates sobre desinformação e regulamentação das mídias socais, além da responsabilidade civil e criminal das páginas de notícias (Caso Jéssica Canedo – 2023), evidenciam que o assunto já é consolidado nas discussões jurídicas.

Todos os casos mencionados são provas inequívocas do poder e da influência que a análise e tratamento de dados pode impactar na vida de pessoas, famosas ou anônimas, e, até mesmo, em sistemas de governo, assunto que afeta invariavelmente disputas acerca da democracia digital.

É o que se verifica, por exemplo, no campo eleitoral. Como é de amplo conhecimento, no ano de 2024 serão realizadas eleições municipais, que envolvem, portanto, os cargos de prefeitos e vereadores. Neste cenário, já se verificam inquietações sobre o conteúdo em vídeo e/ou áudio processado e divulgado por inteligência artificial e quais seriam os impactos diretos na divulgação de informações inverídicas – as chamadas deepfakes.

Áudios e vídeos simulando falas – ou tirando de contexto – atribuídas a políticos ou pessoas influentes em seus nichos podem não apenas terem a finalidade de atacar adversários, mas sim imputar falsas diretrizes aos correligionários. Como divulgado pela CNN Brasil (Eleições nos EUA: uso de deepfake e IA revela problema que pode se repetir no Brasil), às vésperas das primárias do estado de New Hampshire, fora divulgada uma gravação falsa simulando a voz do presidente Joe Biden, pedindo aos membros do Partido Democrata para que ficassem em casa e não participassem das primárias da legenda, sendo que logo após houve o comunicado da Casa Branca, desmentindo-o.

A matéria eleitoral guarda profunda ligação com Privacidade e Proteção de Dados, levando, inclusive, a Autoridade Nacional de Proteção de Dados a publicar o Guia Orientativo de Aplicação da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais por agentes de tratamento no contexto eleitoral. O documento versa, entre outros temas, sobre utilização de base de dados, envio de mensagens eletrônicas e instantâneas e impulsionamento de conteúdo. Tem-se, pois, que a credibilidade do candidato e a verificação do conteúdo se constituem cada vez mais como pontos de atenção e práticas essenciais durante todo o período eleitoral e no curso do mandato político.

Para além da questão eleitoral, há ainda a discussão de segurança pública. O ano de 2023 destacou o debate sobre a utilização de câmeras corporais nas fardas dos Policiais Militares (com destaque para a delicada situação em São Paulo) e na utilização de câmeras com reconhecimento facial em grandes aglomerações – a exemplo de Réveillon e Carnaval – com intensa discussão sobre os casos de falso positivo e falhas humanas. Daí a pergunta: quais são os parâmetros mínimos para utilização de tecnologias para aprimorar a atuação em matéria de segurança pública?

Há ainda o terceiro ponto que congrega os temas anteriores: o Projeto de Lei nº 2630, de 2020, também conhecido como a “PL das Fake News”, apresentada por iniciativa do Senador Alessandro Vieira (CIDADANIA/SE). Se aproximando do quarto ano após a apresentação da iniciativa parlamentar, o PL está desde o dia 04 de outubro de 2023 com a mesa diretora da Câmara dos Deputados, após a retirada de pauta.

A PL, que vêm acompanhada de cinco pareceres, cento e cinquenta e três emendas, oitenta e seis requerimentos e vinte e oito manifestações, acirra os ânimos daqueles que acreditam ser uma afronta à liberdade de expressão nas redes sociais e, ao mesmo tempo, atrai defensores da regulação visando o efeito combate às notícias falsas nas redes sociais.

Dentre os principais ponto do Projeto de Lei, chamam a atenção as propostas que obrigam as plataformas a excluírem contas falsas, implementarem controle de acesso por robôs não identificados e exigirem dos provedores a criação de mecanismos de detecção de irregularidades.

Como visto, é nítido que o Direito Digital se afasta da figura de ser apenas uma resposta temporária às transformações tecnológicas e, em verdade, se consolida como uma peça intrínseca no exercício das relações sociais e dos consequentes resultados jurídicos.

O ano de 2024 já se apresenta com potencial para consolidar grandes transformações culturais relacionadas à privacidade e proteção de dados. Em âmbito mundial e global, cada cidadão repensa o seu papel em meio à tecnologia, seja pela superexposição e utilização indiscriminada, seja pela moderação e preocupação com a utilização razoável, ciente das consequências jurídicas e sociais dos temas em destaque.

Hélio Tomba Neto – helio.tomba@cordeirolima.com.br

Caio Figueiroa – caio@cordeirolima.com.br