• Direito Público Consultivo
14/mar/2023
Cordeiro
Órgão Especial do TJ-SP declara a inconstitucionalidade de Lei Complementar do Município de Vargem Grande Paulista, que exigia o pagamento de taxa de pessoas jurídicas nele instaladas para viabilizar programa de “Tarifa Zero” no transporte público

Há mais de três anos foi instituído no Município de Vargem Grande Paulista, Estado de São Paulo, um programa que chamou a atenção daqueles que se debruçam sobre o tema da implementação da “tarifa zero” no serviço de transporte público coletivo: o programa “Transporte para Todos”.

Criado por meio da Lei Municipal nº 1.092/2019, o intuito do programa era que o serviço, anteriormente concedido à iniciativa privada, passasse a ser prestado por meio da celebração de contratos de locação de veículos, sendo incluso em muitos deles os custos tidos com motoristas.  

A modificação da forma de prestação do serviço foi resultado de estudo desenvolvido por Consultoria Especializada, então contratada pela Prefeitura (disponível neste link).

Outro objetivo do Município era custear o serviço integralmente por despesas oriundas do chamando “Fundo Municipal de Transporte”, instituído pela Lei Municipal nº 1.068/2019. As receitas do fundo adviriam de fontes diversas, tais como multas de trânsito, estacionamento rotativo, e a polêmica “Taxa de Transporte Público de Passageiros”. Com isso, aos usuários do serviço não haveria contraprestação tarifária alguma.

            A hipótese de incidência, base de cálculo e alíquota da referida Taxa, foram fixadas na Lei Complementar Municipal nº 94/2019. Nela, foi posto como contribuinte “toda a pessoa jurídica instalada no Município, tendo por base o número de funcionários vinculados às pessoas jurídicas, com alíquota fixa de R$ 39,20”.

            Antes mesmo do julgamento pelo Órgão Especial do TJ-SP, a partir de levantamento feito no site do Tribunal, verificou-se que mais de 20 Mandados de Segurança foram impetrados por pessoas jurídicas instaladas no Município visando a suspensão do recolhimento desse tributo.

Em todas as sentenças, publicadas majoritariamente entre junho de 2022 e janeiro de 2023, a segurança foi concedida para o reconhecimento do direito de as pessoas jurídicas, então impetrantes, não serem compelidas ao recolhimento da Taxa.

No mérito, a Juíza da Vara Única da Comarca de Vargem Grande Paulista pontuou o seu entendimento sobre a ilegalidade e inconstitucionalidade da Taxa, afirmado, em suma, que não seria possível eleger indistintamente como contribuinte toda a pessoa jurídica instalada no Município, além de entender como descabida a fixação de base de cálculo sobre o número dos funcionários vinculados a tais pessoas jurídicas.

Isto porque, conforme o entendimento expressado na sentença, não foram respeitadas as características legais do instituto jurídico de “taxa”, previstas no Código Tributário Nacional (bilateralidade, especificidade e divisibilidade).        

Em sede de apelação de um dos Mandados de Segurança, em outubro de 2022, foi arguido o Incidente de Inconstitucionalidade para o Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo analisar a constitucionalidade da Lei Complementar Municipal nº 94/2019 (Processo nº 0040321-14.2022.8.26.0000).

Mencionado Incidente foi julgado e acolhido pelo Órgão Especial no último dia 03 de março, sendo declarada a sua inconstitucionalidade.

            De acordo com as razões do Desembargador Relator Aroldo Viotti, embasados em parecer da Procuradoria-Geral da Justiça, a principal discrepância na Lei Complementar residiria no estabelecimento de contribuinte como sendo toda a pessoa jurídica sediada no Município. Segundo ele, não seria viável cobrar de uma pessoa jurídica pagamentos devidos a título de taxa, na medida em que ela não é usuária direta do serviço público de transporte coletivo.

As sentenças nos Mandados de Segurança tinham efeitos exclusivamente às respectivas impetrantes, mas o julgamento pela inconstitucionalidade da norma deve ensejar a suspensão da taxa para todos.

Trata-se de decisão extremamente recente. Por isso, ainda não estão está clara a repercussão em âmbito municipal, como, por exemplo, a viabilidade de a Prefeitura de Vargem Grande Paulista passar a subsidiar o Fundo Municipal de Transporte sem contar com o recolhimento do tributo.

Considerando a relevância e atualidade da matéria, tudo indica que ainda há muita discussão por vir, sendo interessante o seu acompanhamento.

Destacamos que há outros meios legalmente admitidos para assegurar tarifas módicas aos usuários e outras fontes de receita que podem auxiliar no custeio dos sistemas de transporte.

A equipe de Público Consultivo do Cordeiro, Lima está à disposição dos clientes para auxiliar nas discussões sobre o tema.

Victoria Andreucci Pereira Gomes Gil – victoria.andreucci@cordeirolima.com.br

Mariana de Melo Sanches – mariana.sanches@cordeirolima.com.br

Caio Cesar Figueiroa – caio@cordeirolima.com.br