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16/out/2023
Cordeiro
STF julga a incidência de IPTU sobre o Aeroporto de São Gonçalo do Amarante (RN), declarando sua incidência apenas sobre as áreas cedidas a particulares para exploração de atividade econômica

Em julgamento de Agravo Interno interposto no âmbito da Reclamação Constitucional (RCL) n° 60.726/RN, a Primeira Turma do STF, por unanimidade, decidiu que os imóveis do Aeroporto de São Gonçalo do Amarante (RN) cedidos a particulares para exploração de atividade comercial não fazem jus à imunidade tributária recíproca atrelada ao Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU).

Nos termos definidos pela decisão da Primeira Turma do STF, a imunidade em relação à cobrança de IPTU apenas alcançará a área relacionada à prestação das atividades obrigatórias vinculadas ao serviço público de infraestrutura aeroportuária, permanecendo a incidência do tributo em relação aos imóveis cedidos a particulares para a exploração de atividade econômica com a finalidade de obtenção de lucro.

Explica-se.

A controvérsia julgada pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) teve origem em novembro de 2017, quando a Concessionária Inframérica – responsável pela administração do Aeroporto Internacional de São Gonçalo do Amarante – ingressou com uma ação anulatória de débito fiscal perante o Tribunal de Justiça do Estado (TJ/RN), requerendo fosse declarada a nulidade dos lançamentos de IPTU realizados pelo Município entre os anos de 2012 a 2017 referentes à área do Aeroporto.

O pedido da Concessionária foi fundamentado na chamada imunidade tributária recíproca, prevista no art. 150, VI, “a”, da Constituição Federal (CF), que veda que a União, os Estados e os Municípios instituam cobrança de tributos sobre o patrimônio, a renda e os serviços uns dos outros.

Partindo dessa previsão, a Concessionária pugnou pela nulidade dos lançamentos referentes ao IPTU, defendendo que o imóvel onde o Aeroporto funcionava seria bem público pertencente à União Federal, estando cedido à Concessionária e afetado à prestação de serviço público, de forma que estaria enquadrado na hipótese prevista no dispositivo constitucional mencionado.

O Município de São Gonçalo do Amarante, por outro lado, suscitou perante o TJ/RN o não cabimento desta isenção, defendendo que a Concessionaria é constituída como uma sociedade empresarial de direito privado, exploradora de atividade econômica, com intuito de auferir lucros e partilhar dividendos entre seus acionistas, não fazendo jus à imunidade tributária em debate. 

A ação proposta pela Concessionária foi julgada procedente pelo Tribunal de origem com fundamento no Tema nº 412 de Repercussão Geral do STF, que fixou a extensão da imunidade recíproca às concessionárias de serviços públicos, restando declarada a nulidade dos lançamentos realizados pelo Município. O entendimento em questão foi mantido em sede recursal até que o Município ingressou com a RCL nº 60.726 perante o STF.

Isso porque, inicialmente, ao analisar as questões suscitadas pelo Município no âmbito da RCL, o Relator Ministro Luis Roberto Barroso proferiu decisão monocrática acolhendo os pedidos formulados pelo Município de São Gonçalo do Amarante, determinando a cassação dos acórdãos proferidos pelo TJ/RN e firmando o entendimento de que a imunidade recíproca não se estenderia a empresa privada cujas atividades tenham manifesto intuito lucrativo, com fundamento nos Temas nº 385[1] e 437[2] de Repercussão Geral do STF.

No entanto, em sede recursal, após a interposição de Agravo Interno pela Concessionária, entendeu-se pela reforma parcial do acórdão proferido pelo TJ/RN diante da não aplicação dos Temas 385 e 437 ao caso, e não mais por sua integral cassação como havia sido determinado em sede de decisão monocrática.

Em análise do contexto fático, o Relator Ministro Luis Roberto Barroso entendeu que não há cabimento do reconhecimento de imunidade tributária em relação a todo o complexo aeroportuário, considerando coerente somente a isenção sobre as atividades obrigatórias que circundam o efetivo exercício do serviço público de infraestrutura atrelado à concessão. Sendo assim, entendeu que os imóveis relacionados ao exercício de atividades acessórias, desempenhadas por empresas privadas com a finalidade de obtenção de lucro, deverão responder pela incidência do IPTU. Esse entendimento foi acompanhado pelos demais julgadores.

Assim, a decisão em comento passa a segmentar a incidência da imunidade tributária com base nas atividades essenciais relacionadas à prestação do serviço público, excluindo da égide da isenção tributária os imóveis pertencentes ao complexo aeroportuário cedidos a particulares para que explorem atividades com o intuito de auferir lucro, quando não aliadas “ao serviço público stricto sensu de infraestrutura aeroportuária”.

Este novo julgado surge como importante precedente sobre incidência do IPTU em relação às áreas de prestação de serviços públicos, de modo que, mesmo não tratando de caso munido de repercussão geral, abre-se margem para a delimitação de novos contornos à discussão em voga.

Ana Lídia Pereira – ana.pereira@cordeirolima.com.br

Bianca Gonçalves Correia – bianca@cordeirolima.com.br

Isabella Vegro – isabella@cordeirolima.com.br

Caio Figueiroa – caio@cordeirolima.com.br


[1] Tema 385 de Repercussão Geral: “A imunidade recíproca, prevista no art. 150, VI, ‘a’, da Constituição não se estende a empresa privada arrendatária de imóvel público, quando seja ela exploradora de atividade econômica com fins lucrativos. Nessa hipótese é constitucional a cobrança do IPTU pelo Município.”

[2] Tema 437 de Repercussão Geral: “Incide o IPTU, considerado imóvel de pessoa jurídica de direito público cedido a pessoa jurídica de direito privado, devedora do tributo.”